quarta-feira, 26 de julho de 2017

Temporada 2017

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (26/7/2017)

Crítica/ “Entonces bailemos”
Ciranda de casais em luta no colchão


No arranjo dramático do autor e diretor argentino Martín Flores Cárdenas para “Entonces bailemos” estão reunidos textos curtos, um tanto soltos, quase independentes, sobre violências nas relações amorosas. Cada uma das cenas é anunciada pelo ator que a viverá em seguida, e introduzida ainda por cantor-cowboy, que preenche o tempo das passagens. No cenário reduzido a um colchão e à frieza de um dispositivo de iluminação, o elenco se distribui por espaço emocional de exposição física dos conflitos, diante do qual, o autor parece querer nos dizer que só resta dançar. Mas Cárdenas mostra que tem ambições mais amplas do que a sucessão de pequenas histórias de fins trágicos ou de agressões verbais. Aparentemente, procura na interseção de atos de brutalidade com gestos de amor, os limites das contradições dos sentimentos. É o que demonstra, com parcialidade, a montagem que na sua costura narrativa deixa frouxa a suposta conceituação dos choques, projetando os embates como luta corporal de efeitos de estranhamento. Na há construção de subjetividade, apenas situações que se sustentam na superfície do depoimento e em escala descritiva. A direção, por identidade indissolúvel com a autoria, acentua a contundência de fachada, encobrindo o pretendido alcance da dramaturgia. A concentração dos quatro atores no colchão, sem presença ativa quando um deles protagoniza o seu monólogo, reforça a fragilidade da escrita. A participação do cantor country, também evidencia o descompasso entre a cena e o seu desdobramento. Na contramão dessa imobilidade, a coreografia brutalizada sufoca a suposta verificação da “violência dos opostos”. Ricco Viana, que participa como músico convidado, desempenha com segurança de instrumentista e domínio de cantor, a figura do cowboy perdido em território estranho. Elisa Pinheiro, quando domestica o seu timbre ácido de voz, interpreta com suave crueldade. Marina Vianna imprime impulsos de corpo e voz em atuação de alta disponibilidade. Leonardo Netto em movimentos menos explícitos, busca ambiguidades. Gustavo Falcão é mais direto em suas intervenções.