quarta-feira, 10 de maio de 2017

Temporada 2017

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (10/5/2017)

Crítica/ “O que terá acontecido a Baby Jane?”
Jogo de dependência e submissão entre irmãs

O texto do americano Henry Farrel, situado nos anos 1930, com o show business como cenário e o culto ao mito estelar como atmosfera, projeta na decadência dessas mentiras, o quadro narrativo. Duas irmãs, crianças impulsionadas pelo pai aproveitador, se apresentam em espetáculos burlescos, numa disputa de papéis que viria a ser, no futuro, uma luta perversa de personalidades. Babe Jane, prodígio na infância, e Blanche , coadjuvante quando garota,  invertem posições na vida adulta. Uma se transforma em fracasso na carreira, e a outra se torna famosa em Hollywood, até que ambas, idosas, confinadas em mansão arruinada, colocam em xeque o passado. Jogos de dependência e submissão, crueldade e rancores refazem lembranças de atitudes que as unem em traições fraternas. O autor se prende a ação, desfocando o ponto sobre o qual pretende situar a trama. De início, parece reverência nostálgica ao mundo do sucesso e às suas trapaças. Para em seguida, apontar para história de suspense, logo desmentida pelo pálido drama psicológico. No cômpito final, resta uma estrutura híbrida, feita de estilhaços que decompõe arranjo mais orgânico. O diretor e adaptador Charles Möeller fez escolha pelo clima nostálgico e cinematográfico que recria imagens e busca referências, ao contrário de investir na tensão potencial do entrecho. A montagem, sob essa perspectiva, perde a já pouca força de suspense, e descaracteriza o frágil contexto emocional. Reduzido à essa feição de aparência, “O que terás acontecido a Baby Jane?” na versão Möller é prejudicada pelo cenografia espaçosa e mal desenhada de Rogério Falcão. A rubrica da mansão, em dois andares, deveria ser respeitada para melhor ajuste realista. Em um só plano, tira a veracidade do isolamento da irmã presa à cadeira de rodas, que acrescido  da amplitude do espaço derruba o intimismo da contenda familiar. Carol Lobato combina o figurino com a passagem do tempo, nas roupas teatrais das garotas e na caracterização de Blanche como deusa hollywoodiana. Sophia Valverde e Duda Matte estão adequadas como as meninas. Juliana Rolim e Karen Junqueira, a dupla crescida, são figuras de enfeite. Teca Pereira é a empregada solidária e Nedira Campos a vizinha bisbilhoteira. Paulo Goulart Filho, pouco se diferencia em seus dois personagens. Nathalia Timberg tem interpretação contida e tímida. Eva Wilma é uma Baby Jane expansiva, mas de traço invariável.