quarta-feira, 5 de abril de 2017

Temporada 2017

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (2/4/2017)

Crítica/ “Deixa a dor por minha conta”
Melancolia e dor de amor no repertório de um violeiro 


A dramaturgia de “Deixa a dor por minha conta” é definida por seus autores, Hugo Sukman e Marcos França, como “um musical sobre a obra de Sidney Miller”. A objetividade com que a dupla trata a carreira do compositor de canções de dor de amor e de melancólica poética, alcança a subjetividade da vida de um músico de poucas gravações e muito secretismo. Nas entrelinhas das letras, revelam-se sentimentos de quem perseguiu o amor com a angústia de sabe-lo irreconciliável com sua curta existência. Sidney morreu, em 1980, aos 35 anos. O compositor, identificado por personagem de nomenclatura vaga (José das Tantas), entra em um bar, no final do carnaval, e neste ambiente de fim de festa e espaço de filosofia de botequim, divide com outros desgarrados da efusão, a sua dor de cotovelo pela amada. O poeta deprimido canta o sofrimento de não encontrar lugar no coração da mulher e no mundo que parece querer deixar. Ao situar as composições em atmosfera carnavalesca declinante, os autores criam um contraponto de algum efeito dramático para um repertório tristonho. O diretor Marcos França imprime dinâmica cênica com muita movimentação para contrastar musicalidade ritmicamente variada à métrica intimista. O cenário e figurino carnavalizantes nem sempre se mostram ajustados ao roteiro que pretende reavivar lembrança de uma obra esquecida. O excesso de agitação por ocupar, ativamente, a área de representação, rompe com os devaneios oníricos trazidos pela música. Ainda que a montagem ganhe em agilidade, a sonoridade de violeiro é confrontada com citações casuais e contida no diálogo com as letras. A direção musical e arranjos de Luis Filipe de Lima  sustentam a qualidade do que se ouve em cena. Os atores – Clara Santhana, Gustavo Ottoni, Hamilton Dias, Ivan Vellame, Julia de Aquino, Lu Vieira, Rômulo Weber e Sophia Dornellas – demonstram coesão interpretativa, seguindo os movimentos coreografados na formação de um coro musical com poucos destaques e muito empenho.