quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Temporada 2015

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (9/9/2015)

Crítica/ “O Pena carioca”
Martins Pena sob a ótica de novos tempos cômicos

Martins Pena é considerado o fundador da comédia de costumes nacional, e sua obra justifica o título por seu humor ingênuo, mas crítico, aos mal feitos da vida social brasileira do século XIX. O mesmo tempo que fixa as melhores qualidades dessa dramaturgia, é, igualmente, o período que a faz atraente como relíquia histórica. Montagens que procuram atualizar ou tentar comparações com os dias que correm, nem sempre se aproximam do que pretendem. Muito menos, aquelas que buscam subverter o que não se encaixa na desconstrução. Daniel Herz, em “O Pena carioca” encontrou o ponto de inflexão entre efeitos cênicos e comunicabilidade direta. Reunindo três comédias de Martins Pena – “ A família e a festa na roça”, “O Judas em Sábado de Aleluia” e “O caixeiro da taverna” -  essa pequena coletânea inclui ainda citações de outros textos nas passagens de uma narrativa a outra. Como cada uma delas vive de situações que revelam a matreirice dos roceiros, os ardis frustrados de quem se considera esperto, e a ambição sem controle, há que retirar da simplicidade dos diálogos, uma renovada conversa com a plateia. O diretor estabelece a ligação dos tempos cômicos com a formalização do espaço, construindo teatralização de contornos acentuadamente desenhados e levemente caricaturais. O bom resultado pode ser atribuído à concepção geral de Herz, que transforma os textos em esquetes, apoiados na bem sucedida direção de movimento de Duda Maia e na trilha original de Leandro Castilho. O visagismo de Diego Nardes complementa nas máscaras de comediantes a ambientação dos cabides com figurinos de Antônio Guedes, que se misturam com figuras vivas do cenário de Fernando Mello da Costa. A iluminação com focos laterais de Aurélio de Simoni, recorta com habilidade os quadros. O elenco desempenha numa linha predominantemente corporal, em que as vozes adotam sotaques e a atuação caricaturas, harmoniosa unidade interpretativa. As atrizes – Ana Paula Secco e Gabriela Rosas – tiram partido da feminilidade astuciosa e da ingenuidade de aparência para criar tipos sempre muito divertidos. Os atores – Anderson Mello, Leandro Castilho, Luiz André Alvim, Marcio Fonseca e Paulo Hamilton – revestem, sem falsos pudores e tímidas reservas, os papéis de donzelas suspirantes ou autoridades venais.