quinta-feira, 17 de julho de 2014

Temporada 2014

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (16/7/2014)

Crítica/ O Comediante
Colagem de gêneros em embalagem convencional

O texto do estreante Joseph Meyer é um acúmulo de desvios em torno de desgastada convenção. Ao centrar a trama em velho ator que está afastado há 20 anos, o autor escolhe o passadismo como veículo para as lembranças pouco lúcidas dos tempos de protagonismo e sucesso. Ao acrescentar anacrônica e fiel governanta, que ao lado de empresário improvável e sem função, contrata flexível jornalista para escrever a biografia do aposentado saudosista, repassa códigos das velhas comédias de costumes. E ao procurar as razões do afastamento, a ação sofre reviravolta para tentar reproduzir narrativas de mistério à moda tradicional. Essa colagem de influências demonstra que Meyer foi à fonte de cada uma delas para encaixar no híbrido narrativo que engendrou. Não há qualquer vestígio de originalidade autoral, ao contrário, reforçam-se desgastados meios expressivos para, suspostamente, atender as referências conhecidas da plateia e, deste modo, estabelecer trânsito fácil na comunicação. Com possibilidades tão restritas, “O comediante” somente se viabiliza cenicamente através de perspectiva crítica aos gêneros aos quais recorre como fonte e que são os elementos que sustentam a sua inexpressividade. Pela reiteração da linguagem, talvez seja possível superar as pesadas limitações do tratamento convencional e insuflar alguma vida a formas natimortas. O diretor Anderson Cunha não dá muitas pistas de que adotou essa linha, preferindo levar a montagem na mesma sintonia antiquada do texto. A comédia pretendida de início, termina tão logo os diálogos se esgotam no vazio do humor e na condescendência do diretor à facilidade. O mistério insinuado, é desfeito assim que fica evidente que não existe enredo que o justifique e que o espetáculo transforma em melodrama. A idade que tritura a vida profissional é vista, pelo autor e pelo diretor, como um encorpado dramalhão. Os sinais de envelhecimento se estendem ao cenário de José Dias, ao figurino de Marília Carneiro e ao elenco. Gustavo Arthiddoro não consegue corporificar o inexistente empresário. Carolina Loback é apenas a jornalista falastrona. Angela Rebello com postura caricatural compõe a delirante governante. Ary Fontoura não se esforça para tornar o ator decadente menos inconsistente.